Crítica | O Doutrinador

Primeiramente vamos deixar claro que o título do filme ‘O Doutrinador’ em tese indicaria que o protogonista ensinaria e/ou doutrinaria seus desafetos já que o adjetivo substantivo masculino em questão indica ‘que ou aquele que doutrina; doutrinante’. Contudo, o que vemos na telona são verdadeiras execuções e se as infelizes vitimas são doutrinadas, esses ensinamentos são recebidos diretamente através do criador. Depois desse esclarecimento inicial, o longa nos apresenta uma corajosa guinada no gênero do cinema brasileiro, saindo das produções de comédias bobinhas ou dramas regionalistas, e se aventurando em uma história de um anti-herói já há bastante tempo explorada com sucesso em Hollywood. Nesse sentido, toda a produção do longa ‘O Doutrinador’ merece bons aplausos pela iniciativa pioneira, porém no aspecto de nos entregar um resultado satisfatório acredito que ainda não foi dessa vez como veremos a seguir. Na trama do filme, ambientada em um Brasil propositadamente alternativo, acompanhamos o policial Miguel (Kiko Pissolato) um policial de um destacamento especializado em investigar desvios de verba na saúde (entre outros), resolvendo logo apos uma tragédia familiar) abracar uma jornada pessoal de vingança contra autoridades corruptas. Inspirado demasiadamente e assumidamente por filmes de personagens de diferentes franquias norte-americanas como John WickRorschach (do excelente filme ‘Watchmen’) e Justiceiro (somente para citar alguns) o criador da HQ de base, Luciano Cunha, também nos entrega uma fiel escudeira ao anti-herói, na pele de uma hacker de alcunha Nina (Tainá Medina) para fechar de vez o manual dos super-heróis já amplamente manjado pelo público do referido gênero.

O contexto da trama inegavelmente traz grandes paralelos com a situação real do Brasil dos últimos anos mas espertamente o enredo não busca através de seus personagens trazer qualquer ligação direta com pessoas reais por mais que inconscientemente fiquemos todos buscando tal relação. O roteiro abusa de cenas violentas e por pouco o filme não recebeu uma classificação ainda maior e os amantes de produções com muito sangue (nos EUA chamado de Gore) terão seus desejos atendidos até porque se esse filme fosse um jogo de videogame seria da categoria Hack and slash. Designer de Produção, chamada de Direção de Arte até 2012, foi assinado por Marghe Pennacchi que fez um excelente trabalho de transposição do ambiente da HQ para a telona e aqui responsável por ‘salvar’ a película de uma avaliação ainda pior. O ator Kiko Pissolato fez o que pôde em um roteiro que em nada inova ao estilo vigilante, se esforçando para entregar o que seriam boas cenas de luta se não fossem truncadas e picotadas ao extremo. Justamente nesse quesito, sentimos falta de uma direção competente que pudesse nos entregar algo pelo menos parecido com o que ocorreu na terceira temporada de Demolidor na Netflix (quarto capitulo – ‘Blindsided’) em um plano sequencia alucinante de onze minutos e meio sem cortes e com muita pancadaria. Fica inclusive desde já, a sugestão desse editor tendo em vista que parece que o filme vai mesmo virar uma série de TV pelo canal SyFy, para que esse vital quesito (no gênero) seja melhorado pois nós brasileiros somos capazes de mesmo com poucos recursos fazermos algo bem mais criativo.

Tecnicamente, ‘O Doutrinador’ tem um CGI bem medíocre que faz dupla com uma edição que montou o filme de modo a dar a impressão que vemos um serie mas saltamos um episodio, pasmem. No longa existem algumas faixas musicais que não encontram paralelo algum com o que o público se depara na tela, apesar dos efeitos sonoros serem competentes. ‘O Doutrinador’ se apresenta como um filme de origem mas o roteiro falha na construção dos conflitos internos do anti-herói assim como em apresentar um vilão interessante pois o personagem de Du Moscovis que está bem na função, sai de cena demasiadamente cedo. O terceiro ato é arrastado e conta com cenas somente para ‘cumprir tabela’ como aquelas em que a câmera gira em torno do personagem titulo já bastante exploradas em Hollywood. Ao final da projeção fica a impressão que o filme de baixo orçamento, foi idealizado somente para alavancar sua estreia na TV (onde certamente pode funcionar melhor) pois parece mesmo que estamos assistindo uma serie na telona de quase duas horas de duração. Milhões de clichês do segmento pipocam aos olhos deste o primeiro minuto de filme até o seu desfecho (com direito a cenas pós-crédito) fazendo com que ‘O Doutrinador’ venha a ser, pela simples questão temporal, uma obra pioneira em terras brasileiras em relação a adaptação de gibis, contudo, jamais ser alçado a categoria de cult (em cinquenta anos posso estar errado) ou referência do gênero, sejamos honestos.

Alexandre Carvalho – Editor

  Regular

Ficha Técnica:
Título: O DOUTRINADOR (IDEM)
País/Ano/Duração: Brasil , 2018 , 108 min.
Classificação: 16 anos
Gênero: Ação, Policial
Direção: Gustavo Bonafé
Roteiro: Luciano Cunha, Gabriel Wainer, L.G. Bayão, Rodrigo Lages, Guilherme Siman, Mirna Nogueira, Denis Nielsen, Bia Crespo. Baseado na HQ criada por Luciano Cunha
Distribuição:  Downtown Filmes
Estréia: 01/11/2018
Elenco: Kiko Pissolato, Du Moscovis, Marília Gabriela, Helena Ranaldi, Tainá Medina, Samuel de Assis, Tuca Andrada