Crítica | Coringa

O vilão Coringa é tão conhecido do público quanto o próprio Batman, já que ambos comemoraram 80 anos de existência em 2019, sem contar o fato de que todo grande herói necessita invariavelmente de um complexo antagonista para que se justifique sua existência. Desde o início do discreto projeto (custou ‘apenas’ U$ 55 milhões) a Warner Bros. não deixou claro onde esse universo se passaria pois a empresa já havia estabelecido um Coringa em ‘Esquadrão Suicida’ (Suicide Squad – 2016) interpretado por Jared Leto, inclusive o ator havia sido, nas notícias iniciais da época, cogitado para esse filme solo. Bom, tudo isso é história, pois quem ficou mesmo com o papel foi o ator Joaquin Phoenix, conhecido do grande público pelo vilão Cômodo em ‘Gladiador’ (Gladiator – 2000) dirigido por Ridley Scott. Depois de assistirmos a ‘Coringa’ percebemos que o filme do diretor Todd Phillips obviamente possui vários elementos que o ligam ao universo do Batman, entretanto, fica claro que o longa foi concebido originalmente para funcionar desvinculado de qualquer franquia já estabelecida ou mesmo futura. Não podemos, contudo, descartar a possibilidade futura do estúdio criar um vínculo (desnecessário ao meu ver) com o vindouro ‘The Batman’ estrelado pelo ex-vampirinho de ‘Crepúsculo’ (Twilight – 2008), Robert Pattinson e dirigido por Matt Reeves o qual tem estreia prevista para meados de 2021. Logo no início de ‘Coringa’ vemos um Arthur Fleck (Joaquin Phoenix) em frente a um espelho durante a maquiagem de palhaço tentando forçosamente arrancar um sorriso de seu semblante que insiste em mostrar a estado real do personagem, triste e solitário. Comprovamos de imediato toda a entrega de Phoenix ao icônico papel que já teve Jack Nicholson e Heath Ledger (ganhando o Oscar póstumo de melhor ator coadjuvante em 2009) interpretando o sádico e desajustado vilão.

O roteiro nos brinda com uma história de origem onde acompanhamos o nascimento do vilão o qual é fruto de uma infância de abusos e privações onde o personagem, já adulto, possui consciência de seu frágil estado mental, obrigando-o a tomar pesados medicamentos diariamente. O fracassado comediante Arthur Fleck está em busca de seu lugar na sociedade ao passo que cuida de uma mãe idosa e com problemas mentais além de ter que igualmente lidar com os constrangimentos que seu ‘distúrbio de riso’ o obrigam a passar rotineiramente. A narrativa ocorre em uma Gotham dos anos 80 mas que podia ser qualquer grande cidade americana da época, onde o diretor opta por mostrá-la em tons neutros e decadentes que apenas vão contrastar com a colorida fantasia de palhaço que o personagem irá vestir nos dois últimos atos. A trilha musical fabulosa assinada por Hildur Guðnadóttir é impactante e transforma uma simples caminhada do personagem em algo que prende o espectador e vale lembrar que a escolha do diretor Todd Phillips foi resultado do trabalho que Guðnadóttir havia realizado em ‘Sicário 2’ (Sicario: Day of the Soldado – 2018) deixando-o muito impressionado na ocasião. Joaquin Phoenix está fabuloso no papel (talvez um dos melhores de sua carreira) tendo o desenvolvimento do personagem como o ponto alto do filme mas temos que reconhecer que um longa dedicado exclusivamente ao vilão possibilita um tempo de tela para essa tarefa que os demais filmes não dispunham pois naquele formato o foco era na história do herói e não de seu antagonista. 

Não posso aferir com certeza se a campanha de marketing de ‘Coringa’ obteve sucesso em ‘vender’ o filme correto pois o grande público, acostumado há mais de uma década com os filmes de heróis da Marvel, pode estar esperando algo com grandes explosões, perseguições e efeitos especiais e nada pode se distanciar mais do que foi entregue pelo diretor/roteirista Todd Phillips. Em ‘Coringa’ temos um drama policial, onde acompanhamos o surgimento de um criminoso fruto do meio em que vivia e que por coincidência é também o vilão do universo do Batman mas que sem os nomes conhecidos do cânone, o longa poderia sem enquadrado como sendo simplesmente um excelente thriller. O elenco de apoio está afinado e conta com a presença da promissora atriz Zazie Beetz, famosa por ‘Deadpool 2’ (idem – 2018) e Robert De Niro, aqui dando uma espécie de benção e validando as descaradas e propositais referências a ‘Taxi Driver – Motorista de Táxi‘ (Taxi Driver – 1976). ‘Coringa’ antes de mais nada é um filme perturbador e adulto e no Brasil obteve a indevida classificação de 16 anos pois acredito que a escolha mais acertada seria classificá-lo como para maiores de 18 anos. Até o fechamento dessa matéria observamos algumas manifestações contrarias ao filme onde o mesmo foi acusado de ‘glamourização da violência‘ mas entendemos que não cabe ao diretor/roteirista, dentro de sua liberdade criativa, apontar o certo ou errado e tal discernimento cabe mesmo ao telespectador maduro. Tudo funciona muito bem em ‘Coringa’ e se após a sua exibição continuamos a pensar a respeito do que vimos, acredito que o filme conseguiu seu objetivo. 

Alexandre Carvalho – Editor

Maravilhoso!

Ficha Técnica: Título: CORINGA (JOKER)
País/Ano/Duração: Estados Unidos, 2019, 122 min.
Classificação: 16 anos
Gênero: Drama, Policial, Thriller
Direção: Todd Phillips
Roteiro: Todd Phillips, Scott Silver
Produção: Todd Phillips, Bradley Cooper, Richard Baratta, Bruce Berman, Joseph Garner, Emma Tillinger Koskoff
Estúdio: DC Comics, DC Entertainment, Joint Effort, Warner Bros.
Distribuição no Brasil: Warner Bros.
Estréia: 03/10/2019
Elenco: Joaquim Phoenix, Robert De Niro, Zazie Beetz, Bill Camp, Frances Conroy, Brett Cullen, Glenn Fleshler, Douglas Hodge, Marc Maron, Josh Pais e Shea Whigham